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Abr12
Um livro, uma receita #25 (ou o elogio do Minho)
Na outra encarnação, devo ter nascido minhota.
No Minho, sinto-me em casa. E um dia gostava de lá viver. Numa quinta pequenina e rústica, com jardim e horta e uma cozinha enorme com uma grande janela em frente ao balcão, onde passaria largas horas a fazer bolos, biscoitos e pão e a experimentar receitas novas com os legumes acabados de apanhar.
Provavelmente esse dia nunca há-de chegar, mas o Minho é uma terra generosa, e por isso dá-me muito, mesmo não vivendo lá.
Gosto de tudo no Minho: das pessoas de sorriso aberto e com uma certa vaidade na sua origem; das feiras e romarias (viva a feira de Barcelos! viva a feira de Cerveira!); da zona litoral (com um fraquinho por Caminha, onde passo férias desde a adolescência), das vilas e cidades do interior; dos campos pequenos divididos com muros baixos de pedra, dos espigueiros, do artesanato (sobretudo da ourivesaria e dos bordados), da comida...
Esta paixão vem de família. Era ainda pequena e a minha mãe levou-me às costureiras e bordadeiras de Cardielos, para me fazerem um traje regional à medida. E mãe sensata manda fazer a roupa de forma a que dure muito tempo, por isso o fato 'de lavradeira' ainda me serve (digamos que também não saí alta nem espadaúda).
Adoro a camisa, o corpete, a algibeira em forma de coração, as chinelas...
Com o tempo, o Minho foi entrando na minha vida de outras formas: temporadas regulares em Caldelas, com as primas, a fazer companhia à nossa avó, que lá fazia tratamentos termais, universidade e primeiro emprego em Braga, colegas de trabalho, amigos, cunhada...
E foi na casa de Viana da minha cunhada, em Meixedo, que almoçámos esta segunda-feira de Páscoa. Um rico almoço temperado pelo sol e, como sempre, pela paisagem retemperadora, que incluiu a visita do compasso pascal e de músicos com gaitas de foles.
Quando cheguei a casa, apeteceu-me pegar neste livro, que folheio sempre que as saudades do Minho apertam. Queria escolher uma receita, queria fazer uma espécie de homenagem a esta região de Portugal que me diz tanto.
A Torta de Viana pareceu-me o desafio perfeito: será que o amor ao Minho me ajudará a enrolá-la na perfeição? É que no meu curriculum de home baker constam várias experiências falhadas neste domínio.
Se conhecem este livro ou outros livros desta colecção, sabem que as receitas são pouco detalhadas e muitas vezes descritas tal e qual como foram recolhidas. Nesta, por exemplo, não é referida a temperatura nem o tempo de forno. Guiei-me por outras fontes e pelo instinto e cheguei a bom porto (e dei saltinhos de alegria assim que vi que a torta não tinha rachado e estava bem enrolada).
Quando a provei, ficou aprovada: leve, saborosa (os ovos caseiros ajudaram), com a proporção ideal de açúcar para um bolo que se quer recheado com doce de ovos. Ou outra coisa boa, como compota ou chocolate. Sim, porque por enquanto não quero mais nenhuma receita de rolo e esta presta-se a várias versões.
Uma nota para o recheio de ovos: a descrição deste na receita é muito evasiva e como eu tinha doce de ovos no frigorífico já feito, aproveitei. É um doce de ovos muito versátil e fácil de fazer, que eu já publiquei algures no blog e aqui deixo novamente.
Um brinde ao Minho. De preferência, com Alvarinho ;)
Torta de Viana
(do livro Cozinha do Minho de Alfredo Saramago)
A receita original pede o dobro destas quantidades:
6 ovos, separados
Raspa de limão qb
125 g de açúcar
100 g de farinha sem fermento
Açúcar para polvilhar
Doce de ovos*
Pré-aquecer o forno nos 200º.
Forrar um tabuleiro (usei um com 36 x 24 cm) com papel vegetal e untar com manteiga ou spray desmoldante.
Bater bem as gemas com o açúcar e a raspa de limão (usei colher de pau e bati cerca de 5 minutos).
Bater as claras em castelo e envolvê-las na mistura das gemas.
Adicionar a farinha, envolver bem para que fique integrada na massa.
Verter sobre a forma, alisar e levar ao forno cerca de 14 minutos ou até o palito sair seco do seu interior (usar um palito fininho, para que o furo não se note depois, como aconteceu na minha!).
Desenformar sobre um pano de cozinha húmido e polvilhado com açúcar.
Retirar o papel vegetal com cuidado e barrar com o doce de ovos.
Aguardar uns 10 minutos e enrolar com a ajuda do pano.
Deixar que arrefeça mais um pouco, aparar as extremidades, se desejar, e passar para o prato de servir.
*Doce de ovos
(receita do chef Luís Francisco)
6 gemas + 1 ovo inteiro
250 g de açúcar
125 g de água
1 pedaço de casca de limão
1 pau de canela
Num tachinho, levar ao lume a água, o açúcar e os aromatizantes (limão e canela).
Sem mexer, deixar levantar fervura. Quando começar a borbulhar (bolhas grandes em toda a superfície da calda), contar 3 minutos. Retirar do lume, descartar o limão e a canela e verter em fio sobre as gemas e o ovo previamente desfeitos numa taça de metal, mexendo sempre. Coar para o tacho e levar ao lume até engrossar, cerca de 10/15 minutos, mexendo sempre para não ganhar grumos e sem deixar ferver. Colocar num frasco, deixar arrefecer e conservar no frigorífico (dura várias semanas, se não meses!). Para a torta, usei um pouco menos de metade desta receita.